Sinceramente, concordo com todas as suas preocupações. O ensino automatista e atomista ainda é uma realidade, que tentamos pouco a pouco mudar. Há bons profissionais levando uma nova postura às escolas, sobretudo às do interior. Estou começando a vivenciar essa mudança de atitude com os professores que estão sob minha responsabilidade na formação continuada dada pela UnB. Suas ponderações terão de causar reações em todos eles, que nos lêem também, pois estou publicando essas conversas sobre Educação no blog (http://www.dioneygomes.blogspot.com/ ). Espero que não se importe.
Confundir alfabetização com letra cursiva e, pior, exigir caligrafia é o cúmulo das atuais metas da Educação Pós-Freiriana!!! Temos de investir no bem-estar da criança na escola, com aulas criativas e voltadas para a Alfabetização e o Letramento (aqui sigo Magna Soares). Também não concordo com geração espontânea de conhecimento e muito menos com o típico professor-sabe-tudo. Deve haver um equilíbrio aí. Ofereça algo ao seu aluno, mas, principalmente, deixe ele compartilhar em sala o vasto conhecimento que já tem. É tão óbvio e tão fácil para mim, como professor, que ainda não entendi por que se reluta tanto em dar voz ao aluno!!!
Sobre a exigência de letra cursiva, estamos levantando dados reais. Te manteremos informado.
Obrigado pela bela discussão proporcionada. Volto a dizer que estou à disposição para ir à escola do Gustavo quando você quiser. Já será um bom treino para mim que, quando tiver filhos, morarei na escola por uma semana para ver como as coisas andam ou não andam! :D
Abração!
Dioney
----- Original Message -----Sent: Monday, June 30, 2008 2:08 AMSubject: Re: [Alfabetização, Letramento e Transformação] Re: Fw: Síndrome atinge 15% dos p...
Fala véi,
As coisas estão todas truncadas aqui. Fiz uma reclamação geral sobre o sistema de avaliação que o MEC usa devido ao impacto que isso gera na pressão sobre os professores. Isso tudo devido à reportagem que você me enviou, sobre a síndrome de burnout, uma reportagem bem clara!
As metas não são apenas da Provinha Brasil, mas também do IDEB. Há metas. Meta quer dizer objetivo, que precisa ser alcançado, pressão. Não precisa pensar muito pra entender o que significa meta. Essas metas infestaram o país desde os tempos de FHC. Depois do neoliberal, tudo passou a perseguir a eficiência. A eficiência máxima é algo perseguido na engenharia, e na burocracia do Estado! Weber fala muito disso. Ao contrário de Marx e Durkheim, Weber era muito pessimista. Sabia que a tecnocracia das organizações exige eficiência, estudo, competência dos funcionários. É o diploma que conta! Seu pessimismo se encontra no fato de que não via saída alguma para a sociedade moderna, ao contrário dos outros dois (precisaria de um lado político para isso). Talvez estivesse certo. Olha isso: "competências que a criança deve atingir nesse período, mas caso ela não tenha atingido o nível máximo, a escola deve trabalhar, com tranqüilidade". Com tranqüilidade é um eufemismo que a síndrome de burnout não conhece.
Ao criticar o sistema de provas, e acho que crianças não devem fazer provas, pois a educação de crianças não deve ser técnica e, sim, humanista, falei das metas (que eu sei que existem no IDEB, principalmente), porque cria-se uma cadeia de pressões que culminam no adoecimento dos professores e dos alunos, e de nada adianta as boas intenções dos entendidos do MEC, porque de boas intenções o inferno tá cheio, e falei sobre o problema da letra cursiva (letra, não letrinha, já que a letra das crianças é do mesmo tamanho, e muitas vezes maior, o que causa neuras no professor), algo que é, digamos, endêmico no DF. A neura não é minha, é dos professores do DF (e quiçá de outros estados). Quem tinha que conversar com todo o sistema educacional brasileiro era o MEC, não eu. Eu pago meus impostos. Todos os colégios acham importante por um motivo ou outro o diabo da letra cursiva. Imagina se Pero Vaz de Caminha visse a letra cursiva dos professores. Iria achar que são garranchos. Então, qual a letra cursiva mais bonita? Mas a professora (que vai estourar com burnout) falou que era cobrado na provinha brasil. Como eu adoro provas, já deu para perceber, juntei tudo num balaio só. E isto é correto, já que provas para crianças pequenas (mesmo as de boas intenções) devem ficar todas no balaio da porcaria (e olha que como resolvedor de provas sou excelente, pois fui muito bem criado nesse sistema).
O colégio gosta é de aplicar os testes da psicogênese. Não que seja errado. Acho interessante o professor fazer isso. Quem me contou foi o próprio Gustavo. Mas acho que já é uma preocupação com a Provinha Brasil, que a escola não deveria se preocupar, pois deveria ser tudo espontâneo, já que ninguém vai cobrar metas e a síndrome de burnout não existe.
E quanto a cobrar ortografia, por favor, cunhadinho, você é o entendido do assunto. Ortografia? A própria palavra é preconceituosa. Traz a noção do certo e errado. Olha isso: "35% das crianças estão saindo da fase de alfabetização sem reconhecer os elementos mínimos da ortografia". O que diabos tem a ver alfabetização com ortografia? Deixa pra lá, isso é com você e eu sei o tanto que você adora ortografia, talvez mais que eu as provas. :D
Não adianta tentar mudar a visão da escola. É a visão da sociedade. Na reunião com os professores, os pais exigem provas, mais deveres de casa e letra cursiva (além das orações no início de cada aula e antes do lanche, os momentos mais importantes da aula). O MEC mal sabe o que acontece na escolas da UF em que ele tem sede. Imagina no interior do país.
Eu não tenho muito problema com letra cursiva. O Gustavo até está aprendendo bem rápido. Ele tem um vocabulário enorme e, mesmo que não soubesse escrever (e ele sabe escrever um monte em letras de forma), já seria mais alfabetizado que muita gente por aí que escreve. Ele podia estar aprendendo outras coisas agora, mas letra cursiva é bom para treinar desenho e coordenação motora. A sua visão será crítica quanto a isso. Já é crítica quanto as orações, quanto às provas... :D. Eu fico pensando é nas outras crianças que os professores concluem que tem "dificuldades". Têm crianças lá que, quando você observa na hora do intervalo, são perfeitamente normais. São crianças! Mas, quando vem a reunião com os pais, você vê os professores assim: fulano, seu filho ainda está na fase pré-silábica, mas está evoluindo bem, está certo para a idade, mas vou ter que dar uma puxadinha nele. É muito intessante isso tudo. A gente vê tentativas de mudanças (antigamente era muito pior, eu sei, o professor já chegava e chamava de burro), mas as mudanças giram em torno de um mesmo centro de gravidade.
Esse é um fenômeno no DF. A Lili, com os projetos da Pedagogia em que ela se envolve, vê coisas inacreditáveis nas escolas.
Mas, e aí? No final, não entendi. Tem ou não tem letra cursiva na Provinha Brasil? Em outras palavras, é espontâneo, tudo bonito e talz, mas eles avaliam quem escreve com letra cursiva ou não? Quem espontaneamente responder com letra cursiva terá um desempenho melhor? Se sim, infelizmente a escola está certa, em consonância com as metas. Ensina letra cursiva aos alunos, de forma "gradual" e "tranqüila", pois seu papel é acompanhar os parâmetros avaliados pelo MEC. Afinal, a alfabetização que o MEC avalia, infelizmente, não brota ou nasce espontaneamente na criança. É construída com interferência do professor. Se não, então a letra cursiva é perda de tempo.
Outras dúvidas, a Provinha Brasil possui tempo máximo para ser realizada ou ela pode ser realizada no tempo da criança? Por que o nome "Provinha", já que deve ser respondida natural e espontaneamente? Provinha é porque é pequena ou é para deixar delicada para as crianças? Ela prova o que?
Um abraço,
Ricardo
3 comentários:
Quando será que veremos uma mudança efetiva? Como educadora em formação, sinto arrepios em ler coisas como estas e me lembrar que algum dia também já passei por isso. E não foi na alfabetização, pois minhas "Tias" da pré-escola foram maravilhosas comigo, me letraram muitíssimo bem e devo muito a elas. Mas me refiro ao ensino fundamental e médio, em que passamos grande parte de nossas vidas e nunca tivemos voz. Somos castrados, privados de expressão e temos de ler slogans como "a arte de educar bem", well well... Espero que todos sejamos Robôs muito bem educados....
Thalita,
Aproveito o seu e-mail para evocar, com carinho e respeito, os nomes da minhas professoras de 1a à 4a série: Olâmpia, Vera, Lili e Bernadete. Da 8a série ao 3o ano, tive a honra de ter sido aluno do grande prof. José Gadelha, um ícone da educação moderna, libertadora e reflexiva!
A todos eles, o meu muito obrigado!!!
Queria que minha memória fosse tão brilhante como a sua. Mesmo não me lembrando dos nomes de minhas "Tias", me lembro de cada brincadeira, cada sorriso e cada bronca que cada uma delas me deu. Sorte tremenda! =))
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