É muçarela. Assim, com ç. Ou mozarela. O assunto foi questão de concurso promovido pela prefeitura de Jundiaí. Ninguém acertou. Candidatos a vaga no serviço público recorreram. Foram a especialistas e tribunais. Em vão. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa e os Aurélios da vida registram a forma exigida pelo gabarito.
Até então, a polêmica estava restrita à cidade paulista. Com a divulgação, ganhou notoriedade. Leitores de Europa, França e Bahia reagiram. Alguns ameaçam cancelar a assinatura do jornal caso as colunas insistam com a escrita estranha. Outros passaram a fiscalizar cardápios de pizzarias. Se o menu desobedece ao paizão, os fiscais da língua têm duas respostas. Uma: exigem a correção. A outra: ameaçam não pagar a conta. Há, também, os desgostosos. É o caso do editor Leozinho:
– Muçarela com ç? Cruz-credo! Tira a graça da pizza.
O Luiz, colega do Leozinho, radicalizou:
– Desde que soube da novidade, deixei de comer pizza.
Preocupados com a repercussão no comércio e na dieta dos brasileiros, os editores suplicaram:
– Pelo bem de todos e felicidade geral de pizzaiolos e comilões, repita a coluna. Assim, ficará clara uma verdade.
A grafia é convenção. Não interfere no sabor da delícia que veio da Itália e virou preferência nacional.
Pedido de chefe é ordem. Como diz o outro, manda quem pode. Obedece quem tem juízo. Eis o repeteco.
Concurseiros em polvorosa
Os concursos estão em alta. Com razão. Submeter-se a processo seletivo é a forma mais democrática de conseguir emprego. Os aprovados entram no serviço público pela porta da frente. É uma glória. Adeus, pistolão! Adeus, favores políticos! Outro dia, a Prefeitura de Jundiaí abriu concurso para o cargo de educador social. A turma ficou em polvorosa. Varou noites e noites debruçada nos livros. No dia da prova, estava afiada que só. Mas uma questão levantou polêmica na cidade. Cobrava a grafia correta do queijo que faz a festa das pizzas. Qual é ela?
a. Mussarela
b. muçarela
A polêmica
Segundo o dicionário Houaiss, a grafia correta é com ç. (Também existe a forma mozarela.) Estranheza e revolta tomaram conta do candidatos. Pelo menos 50 participantes entraram com recurso para reclamar da questão. Mas as queixas provavelmente serão vãs. João Celso Neto dá notícias do vaivém da polêmica.
Autor do livro Gramática do português culto falado no Brasil e professor de língua portuguesa da USP, Ataliba Castilho estranhou a grafia da palavra com ç. "Eu mesmo achei que fosse com ss. Sempre escrevi e li desse jeito. Estou surpreso", disse. O professor fez questão de consultar o Houaiss para constatar que sua antiga "mussarela" estava errada.
Para ele, a confusão é comum devido à origem do vocábulo. "Em italiano, ele é escrito mozzarella, com zz, por isso as pessoas costumam fazer a tradução do jeito mais próximo ao cotidiano.
Mas a palavra já foi aportuguesada", explicou. Castilho deu exemplo da palavra pizza, que, diferentemente do queijo, mantém a grafia italiana.
Poucos entendem tanto de queijo quanto Severino do Ramo Santos Soares, 33 anos. Há 15 anos ele trabalha como pizzaiolo e manuseia cerca de 40 quilos de muçarela por dia. "Nunca tinha ouvido falar que é com ç. Nos cardápios dos lugares em que trabalhei sempre estava com ss e, graças a Deus, ninguém reclamou. Nem da gramática, nem do gosto da minha muçarela", brincou.
O gerente do restaurante Vesúvio, Rogério Antônio Fuziger, também estranhou a forma correta. Em sua pizzaria, o cardápio informa "mussarela", do jeito considerado errado. "Ninguém disse nada. Até poderia mudar e colocar com 'ç'. Mas aí sim o pessoal iria reclamar", brincou.
É isso, leitor. A língua tem razões que a própria razão desconhece.
Recado
"A linguagem tem de vestir roupa domingueira."
Guimarães Rosa
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Mirley Piretti
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